Notas sobre semelhanças e diferenças entre Andrea (O Diabo Veste Prada) e Emily (Emily in Paris).

João Biabar, 20.10.2020

Andrea (Anne Hathaway) e Emily (Lily Collins).

O mundo dos filmes de moda não é tão grande assim a ponto de nos fazer esquecer de nossas principais referências. Digo isso porque acho quase impossível assistir a série Emily in Paris (de 2020) e não traçar um paralelo com o filme O Diabo veste Prada (de 2006). Ambas as histórias apresentam diversos pontos comuns, e também diferenças dignas de nota.

Lupin, a série que estreou no dia 08 de janeiro, foi disponibilizada com apenas 5 episódios e tem conseguido uma enorme audiência. Trata-se da história de Assane Diop (Omar Sy), cujo pai foi acusado injustamente pelo cometimento de um roubo, motivo pelo qual foi preso. Inspirado nas histórias de Arsène Lupin, Assane inventa o seu próprio estilo para tentar desvendar o que realmente aconteceu. A série é estrelada pelo ator, roteirista, dublador e humorista francês, Omar Sy, que ganhou notoriedade, no Brasil, por meio do filme Intouchables, de 2011, filme que foi assistido por quase 20 milhões de espectadores e foi o terceiro maior sucesso do cinema francês.

Comecemos pelas semelhanças. Em Emily in Paris, série da Netflix, o styling é assinado por Patrícia Field, a mesma figurinista do filme O Diabo Veste Prada (além de ser também mesma figurista de Sex and The City). Nos referidos filme e série, as protagonistas são americanas que trabalham num ambiente de moda e sonham conhecer Paris, a trabalho. O paralelo fica mais forte ainda, se nos lembrarmos do episódio do nome. No filme, a protagonista chama-se Andrea, vivida charmosamente por Anne Hathaway, contratada como segunda assistente, pela temida Miranda Priestly. Miranda insiste em chamá-la de Emily, ome de sua primeira assistente, durante boa parte do filme. Passa a chamá-la de Andrea, somente quando aprende a reconhecê-la como uma profissional, o que leva bastante tempo.

Andrea (Anne Hathaway) e sua chefe, Miranda Priestly (Meryl Streep)

As coincidências, no entanto, não param por aí. No filme e na série, as heroínas precisam se desdobrar para agradar às suas chefias. Explico. No filme, a referência comportamental da chefe encontra-se no título: “o diabo”. Em termos de marketing, a escolha não poderia ter sido mais interessante – o título realmente chamou muito a atenção. O “diabo” que veste prada, obviamente, seria a intolerante Miranda Priestly, como bem mostram as primeiras cenas do filme: Miranda, descendo do carro para entrar no prédio onde funciona a Runnway (revista de moda), com uma bolsa Prada cinza, focada pela câmera - dá pra ler o nome enorme marcado no objeto. Enquanto ela caminha e se aproxima do prédio, o escritório entra em desespero, totalmente justificável pelo estilo arrogante da personagem.

Emily Cooper, interpretada por Lily Collins.

Em Emily in Paris, Emily Cooper, interpretada por Lily Collins, acaba tendo duas chefes. A primeira que aparece na história é a sua chefe americana, de nome Madeline, uma pessoa om quem ela tem um ótimo relacionamento, e que lhe oferece, de última hora, a chance de trabalhar em Paris, quando acontece da empresa em que trabalham adquirir uma divisão de marketing de luxo, naquela cidade.

Kate Walsh, interpretando Madeline.

O problema com a chefia começa nesse ponto. Na França, Emily Cooper passa a ter uma segunda chefe, Sylvie, da agência de marketing Savoir. Sylvie, em papel muito bem interpretado por Philippine Leroy Beaulieu, adquire uma antipatia pelo jeito “empreendedor” de Emily e atua para intimidá-la, falando e agindo sempre em tom reprovador.

Sylvie, interpretada por Philippine Leroy Beaulieu.

Enquanto as dificuldades entre Emily Cooper e Sylvie restringem-se mais ao campo cultural (temos que lembrar que Emily mal se virava no francês), no caso de Andrea e Miranda, o problema seria mais grave, estaria na dificuldade desta em lidar com noções de limites. As repetidas vezes em que simplesmente joga sua bolsa e casaco sobre a mesa da sua segunda assistente, vomitando solicitações, sem declinar detalhes, e sem dar tempo necessário para que se possa registrá-las - como uma máquina de cassino defeituosa, que resolve expelir dezenas de moedas por minuto -, esperando que a empregada recolha cada palavra, lembre, saiba ou simplesmente adivinhe todo o mais sobre o qual está pensando, é simplesmente assustador, para dizer o mínimo. Sylvie, por outro lado, prefere militar no campo da exclusão, procurando demonstrar que Emily não preenche os requisitos franceses para militar no marketing de luxo: não haveria espaço para ela e nem para as suas estratégias de marketing dentro da empresa.

Apesar das coincidências iniciais, ao longo das estórias, elas vão diminuindo. Andrea é seduzida pelo mundo da moda e compra a ideia de se tornar uma assistente competente (quero dizer, submissa a todo o tipo de exigência e comportamento descabidos de Miranda). Com o tempo, ela acaba conquistando a confiança de sua chefe, a ponto de ser convidada para ir a Paris, no lugar, de Emily, a assistente principal de Miranda. O requinte de crueldade dessa alteração é Miranda fazer a própria Andrea dar a notícia para a sua colega de trabalho. Essa é a cereja do bolo, o prêmio que Andrea recebe por se superar em sua disposição à subserviência total (afinal, o filme repete que “milhares de meninas se matariam para estar no lugar dela”). No caso de Emily Cooper, o comportamento é totalmente diferente. Emily não se torna submissa. Muito pelo contrário. Digno de nota é a cena em que ela retruca um de seus colegas de trabalho, utilizando-se de um aplicativo de tradução, quando este insiste em apelidá-la de “La Plouc”. Emily não se cansa de lutar para se impor e se colocar em pé de igualdade, mesmo em outro país, mesmo que, desajeitadamente, inserida em outra cultura. Ela acredita que deve ser medida pela mensagem valiosa que tenta passar dentro da empresa, o trabalho que acredita que fará diferença: as suas propostas de renovação das políticas e estratégias de marketing, baseadas em redes sociais. Talvez essa opção não estivesse ao alcance de Andrea. Mas, para Emily, esta é uma condição para continuar amando o que faz. Sem direito ao respeito e à autoestima, para ela, nenhum trabalho vale a pena para ela, mesmo que seja em Paris, mesmo que seja no glamoroso mundo do marketing de moda.

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Escrito por João Luís.

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